A campanha Sou Ntavase é baseada em histórias de vida verídicas de vítimas e sobreviventes da violência sexual. Tem como objectivo, falar, agir, cuidar das sobreviventes e chamar atenção a sociedade moçambicana para que se posicione e repudie todas as formas de violência praticada contra meninas, raparigas e mulheres, com enfoque para violência sexual e acima de tudo, procurar responsabilizar as instituições públicas, a sociedade em geral na tomada de medidas concretas para acabar com este mal que assola as mulheres, raparigas e meninas.
Precisamente no dia 09 de Abril do corrente ano, como temos vindo a fazer nas nossas redes sociais, partilhamos o caso de uma menor de 12 anos que foi violada por um homem de 39 anos, no distrito de Matutuine, em Maputo. Hoje, convidamos o/a internauta a acompanhar a segunda (2ª) parte desta história, que mostra toda a revolta da população de Matutuíne e quiçá, a nós como um movimento, perante esta e outras violações que vem acontecendo um pouco por todo o país, o que demonstra a normalização destas práticas e até a sistematização, a cumplicidade das instituições públicas.
O caro Internauta pode revisitar a 1ª parte desta história em: https://web.facebook.com/RoscCrianca/posts/2933540490250261
2ª Parte: Homem de 39 anos viola sexualmente uma menor de 12 anos, na Vila da Bela Vista, província de Maputo
Ao saber do sucedido, o tio da menor foi para a esquadra denunciar o caso, na companhia da avó da menina. Os agentes que os atenderam trataram de capturar imediatamente o violador. Na esquadra, ele negou tudo e disse que não conhecia a menina. De seguida, o tio da menina chamou a jovem que fez as tranças da menina e confirmou que foi ele quem deixou a menina na sua casa alguns dias antes.
Durante o processo de apuração dos factos, o agente foi orientado por uma colega a não anotar absolutamente nada. Mais tarde, soube-se que a agente que orientara seu colega era namorada do violador. O agente apenas passou uma guia para o hospital.
No hospital, os profissionais de saúde que atenderam a menina também foram orientados a não tratar do caso devidamente. A menina e a família passaram por humilhações no hospital. Um dos profissionais de saúde afirmou que ela não sofreu nenhuma violação e que ela estaria a inventar toda a história. Um outro, disse que ela deveria revelar o verdadeiro namorado que fez isso com ela. Entretanto, os mesmos profissionais de saúde receitaram os medicamentos para fazer a profilaxia pós-exposição. Os familiares perguntaram-se “como estão a dar os medicamentos se dizem que não houve violação?”
Ao ver injustiça praticada, o tio da menina procurou directamente o comandante local e contou o caso. O comandante passou uma guia para a menina fazer exames no Hospital Provincial da Matola, no departamento da medicina legal.
Quando o violador ficou a saber que seriam feitos novos exames na Matola, ele sequestrou a menina e a manteve em cativeiro por três dias, amarrada numa cadeira, sem água nem comida. Para sequestrar a menina, o violador teve a ajuda dos seus familiares e alguns amiguinhos da menina. Para a menina aparecer, o tio teve que ameaçar o violador de morte. Três dias depois, ela foi jogada no mesmo local em que a sequestraram, quase inconsciente. Quase sem sentidos e com 20 meticais na mão, um dos sequestradores deu o valor para ela comprar água ao ser solta. Ela foi encontrada semi-incosciente por alguns conhecidos que a levaram até a casa da avó, onde teve os devidos cuidados e recuperou as forças.
Dois dias depois, já recuperada, o tio e a avó levaram a menina para o Hospital Provincial da Matola onde fez uma série de exames, e o médico legista confirmou a violação e graves lesões internas, e comunicou-lhes que havia uma necessidade fazer um tratamento específico. Mas devido a dificuldades financeiras, a família não conseguiu continuar com os tratamentos da menina.....
No entanto, os documentos hospitalares deveriam ser levantados na presença de um agente do SERNIC daquela localidade, mas não foram levantados por causa dos problemas levantados anteriormente.
As aulas iniciaram e a Ntavase não consegue ir a escola pelo trauma causado, visto que o trajecto para a escola é o mesmo que foi usado pelos sequestradores. Ela tem medo de voltar a vivenciar o mesmo trauma.
A população da Vila da Bela Vista está agastada com a situação visto que esta não é a primeira vítima deste “Tio Violador”. Elas contaram a campanha que para lograr os seus intentos, ele alicia as crianças prometendo dinheiro, roupas e mechas, de seguida as tranca no salão e as viola, tal como aconteceu com a mais recente vítima. Contam ainda que, a polícia local nada faz para travar o violador, havendo vários processos contra ele estagnados. Neste último caso, ele pagou o valor de 26 mil meticais aos agentes da polícia para que o caso parasse (segundo apuramos no terreno).
No ano passado (2020), os populares vandalizaram o salão do violador e este foi orientado pela própria polícia a se afastar por uns tempos da localidade. Mas de tempos em tempos ele aparece e ameaça de morte seus perseguidores e diz que nada de mau acontece com ele porque “come com os chefes”.
Este caso mostra realmente que as instituições públicas que deviam proteger e cuidar dos interesses da população muitas das vezes estão coniventes com os criminosos como este caso demonstra. Nós exigimos que as instituições se posicionem e actuem conforme seus mandatos para salvaguardar os direitos dos cidadãos e acima de tudo que tratem com humanismo e dignidade as sobreviventes de violência sexual. Pedimos ainda que punam exemplarmente os agressores.